O que muda nas relações sindicais e trabalhistas com a lei da liberdade econômica

O que muda nas relações sindicais e trabalhistas com a lei da liberdade econômica

Da Legislação

No dia 20 de setembro foi publicada no Diário Oficial da União a Lei 13.874, que institui a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica. Se no Projeto de Conversão foram acrescidos diversos dispositivos que de fato alterariam substancialmente regras trabalhistas, as alterações feitas no plenário da Câmara, somadas as de última hora promovidas pelo Senado, praticamente reduziram aquilo que já se chamou de minirreforma trabalhista a pó.

Se a Câmara havia desidratado a proposta em relação às questões sobre a constituição de CIPA; CARF trabalhista; e adicional de periculosidade dos motoboys, o Senado, numa verdadeira lambança, excluiu as regras de alteração do trabalho em domingos e feriados. A grande expectativa inicial acabou gerando um cenário de frustração total.  Abaixo passamos a destacar as modificações sobreviventes no texto final.

O primeiro aspecto diz respeito às leis municipais que regulam horário de funcionamento do comércio. Segundo entendimento consubstanciado em súmula pelo STF, compete ao município legislar sobre assuntos de interesse local, dentre os quais se enquadra o horário de funcionamento do comércio. A nova lei, entretanto, consagra o direito do desenvolvimento de atividade econômica em qualquer horário ou dia da semana, inclusive feriados, sem encargos adicionais (única exceção é de natureza trabalhista). Portanto, nos parece que a regulação do funcionamento do comércio pelo município, enquanto ato público, deverá observar este princípio. Ademais, na edição de futuras leis os municípios deverão implementar uma análise de impacto regulatório (impacto econômico).

Em apertada síntese, é possível argumentar que leis municipais restritivas hoje vigentes estariam revogadas tacitamente pelo novo marco legal; e que não seria possível a edição de novas leis municipais no mesmo sentido, sob pena de violação ao princípio da legalidade. Em ambos os casos é possível suscitar a discussão através do controle concentrado de constitucionalidade, valendo-se da teoria do bloqueio de competência.

Quanto ao registro de ponto, ele passa a ser obrigatório apenas em empresas com 20 ou mais empregados (antes o limite era 10). Em que pese a possibilidade prevista na nova lei, mantemos a orientação no sentido de que as empresas mantenham os registros horários que são a melhor prova em eventual futura reclamação trabalhista. Pelo novo diploma legal, a adoção do ponto por exceção à jornada regular passa a ser possível por mero ajuste individual entre empregado e empregador (antes dependia de ajuste coletivo de trabalho).

Já a alteração promovida no procedimento de despersonificação da pessoa jurídica, no nosso entendimento não se aplica às obrigações trabalhistas. Isto porque, não há lacuna na lei trabalhista a respeito do tema. Com efeito, o artigo 10-A da CLT, que prevê a responsabilidade subsidiária dos sócios retirantes em ações ajuizadas até dois anos de sua saída, não foi revogado.

O mesmo se pode afirmar em relação à regra que não autoriza a desconsideração da pessoa jurídica pela mera existência de grupo econômico. A lei trabalhista tem regra específica segundo a qual o grupo econômico é solidariamente responsável por dívida trabalhista (§2º do art. 2º da CLT).

A nova lei, ainda, adota a preferência da CTPS eletrônica, que terá como identificação única o CPF do empregado. O empregador fará as anotações por meio eletrônico nos sistemas informatizados da CTPS em meio digital no prazo de cinco dias úteis, facultada a adoção de sistema manual, mecânico ou eletrônico. Trata-se de um avanço significativo, especialmente para empresas capilarizadas que possuem RH centralizado (característica típica do comércio). Não raro estas empresas eram punidas em ações judiciais sob a alegação de retenção não justificada da CTPS dos empregados.

Finalmente, a nova lei estabelece que o eSocial será substituído por sistema simplificado de escrituração digital de obrigações trabalhistas, previdenciárias e fiscais.

As novas regras de direito material passam a valer em 90 dias contados da publicação, e as instrumentais a partir da publicação.

É evidente que sempre saudamos alterações legislativas que tenham como objetivo destravar o arcaico modelo regulatório das relações trabalhistas. Portanto, a edição da Lei da Liberdade Econômica deve ser elogiada. Entretanto, pelo menos no aspecto trabalhista, não podemos nos afastar do grupo de frustrados, pois de fato a montanha pariu um rato.

Flávio Obino Filho

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