18 dez Em alta, emprego verde tem desafios à frente
Em alta, emprego verde tem desafios à frente
Retrocesso em leis ambientais e restrições fiscais são algumas das dificuldades para avanço mais acelerado.
O número de empregos verdes – que contribuem para preservar o meio ambiente e são sustentáveis do ponto de vista de impacto ambiental – vem batendo recordes no Brasil e tem potencial para se expandir com muito mais força, segundo especialistas. Essa ampliação, contudo, dependerá não apenas de investimentos, mas também de treinamento e direcionamento político para a transição energética.
Em outubro de 2023, os empregos verdes chegaram a 2,34 milhões de trabalhadores formais (5,2% do total de vagas com carteira assinada no Brasil), mostram dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) compilados pela LCA Consultores. Em outubro de 2022, eles eram 2,26 milhões e, cinco anos antes, 2,11 milhões.
Segundo publicação recente da Agência Internacional de Energia Renovável (Irena), em parceria com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Brasil gerou 1,4 milhão de postos de trabalho na indústria de energias renováveis em 2022, o que representa 10% das vagas mundiais. Os números diferem das cifras do Caged porque são feitos com base em metodologias distintas.
A OIT estima que até 2030 sejam criados 15 milhões novos empregos verdes na América Latina, sendo metade no Brasil. A Irena prevê que, globalmente, sejam 38,2 milhões de novos postos relacionados a energias renováveis dentro de sete anos, caso seja feita uma transição energética ambiciosa.
Os dados compilados pela LCA mostram 129 de 1.357 subclasses (9,5%) de atividade econômica que pertencem a cinco grandes grupos que contribuem para uma economia mais sustentável. São eles produção e manejo florestal; saneamento, gestão de resíduos e de riscos ambientais; geração e distribuição de energias renováveis; manutenção, reparação e recuperação de produtos e materiais; e transportes coletivos alternativos ao rodoviário e ao aéreo.
‘Temos de garantir que a transição para uma economia de baixo carbono seja inclusiva e justa”
Segundo Bruno Imaizumi, economista da LCA Consultores, o número de empregos verdes vem batendo recorde no setor formal devido à vantagem do Brasil em recursos naturais. Mas isso não livra o país de desafios importantes.
“Somos ricos em recursos naturais, mas muitas pessoas que trabalham em áreas como reciclagem, por exemplo, estão na informalidade”, diz. “É preciso incluir essas pessoas de maneira mais benéfica no mercado de trabalho.”
É o caso de coletores de lixo e de material reciclável e classificadores de resíduos, ocupações em geral informais e relevantes para a redução de impactos ambientais.
Imaizumi cita microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua para lembrar que, em junho de 2023, havia 544 mil ocupados nessas classificações, com um rendimento médio de R$ 1.282, abaixo do salário mínimo.
Segundo Vinícius Pinheiro, diretor da OIT para o Brasil, todos esses empregos devem estar associados ao conceito de transição energética justa. “É a ideia que, no momento em que se faz a transformação para uma economia mais sustentável, se leve em conta empregos que serão destruídos, para serem transformados de forma ordenada, visando diminuir a desigualdade e a informalidade laboral”, afirma.
“Fazer uma transição energética [de forma não planejada] pode gerar pobreza e levar a problemas de natureza política. Nos EUA e no Brasil, por exemplo, houve movimentos contrários à economia verde, com argumentos associados à destruição de empregos. Isso gerou um retrocesso político.”
Na opinião de Pinheiro, o Brasil poderia investir no setor agrícola para reduzir emissões, no de transporte para ampliar o número de veículos elétricos, no de gestão de resíduos ao longo de toda cadeia produtiva e no de energia.
“É prevista uma redução da demanda de trabalho no campo combustíveis fósseis, o que pode resultar em desemprego ou perda de renda [de empregados nesse setor], mas um aumento da geração de empregos em energia renovável”, afirma.
Na classificação da OIT, além do grupo de empregos verdes, há o de empregos “marrons”. São trabalhos dependentes da exploração de recursos naturais, como extração mineral e indústrias de base; construção; agricultura e pecuária; e turismo e hotelaria.
Em outubro de 2023, o estoque de trabalhadores formais desse grupo chegou a 8 milhões, representando 17,8% do total.
A Irena estima que em 2022 tenham sido criados no Brasil 856 mil empregos diretos e indiretos na área de biocombustíveis – setor no qual o Brasil é líder global -, 241 mil vagas na geração de energia solar, 194 mil na área de energia hidroelétrica, 68 mil na de geração de eólica, e 41 mil na de energia solar térmica.
Apesar da posição privilegiada do Brasil, onde cerca de 60% da matriz elétrica é hidroelétrica e mais de 80% vêm de fontes renováveis, Imaizumi enumera obstáculos relevantes para o país avançar na transição para uma economia de baixo carbono.
“Além de retrocessos na legislação ambiental nos últimos anos, a falta de capacidade de fiscalização dos governos federal, estaduais e municipais, as duas crises econômicas nos últimos dez anos e as restrições fiscais para áreas como educação, meio ambiente e tecnologia são fatores que dificultam a evolução [mais acelerada] de empregos verdes”, afirma.
Ele argumenta que, apesar de o ritmo para uma economia descarbonizada ter sido lento até alguns anos atrás, essa transformação vem ganhando impulso, embalada também por questões geopolíticas e pela busca por maior segurança energética.
A OIT alerta que redirecionar o desenvolvimento para uma economia verde exigirá o aumento do envolvimento do setor público. “A transição para práticas mais sustentáveis e inclusivas não acontecerá espontaneamente através apenas das forças do mercado”, disse a organização em relatório.
“Dá para o Brasil avançar mais”, defende Pinheiro. “Primeiro, temos de garantir que essa transição para uma economia de baixo carbono seja inclusiva e justa. Requer que as três esferas de governo adotem planos de transição com metas claras, incluindo a de proteção a trabalhadores e a comunidades vulneráveis, como as indígenas.”
Uma outra frente crucial para esse progresso, alerta, é o treinamento para desenvolver habilidade necessárias à transição para uma economia verde.
“Isso demandará investimento e qualificação. Não será automático passar alguém que trabalha com combustíveis fósseis, por exemplo, para atuar na área de hidrogênio verde”, diz, ao lembrar que o setor de energia renovável gera mais emprego que o de combustíveis fósseis. “Não adianta criar oportunidades sem a mão de obra estar preparada.”
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