22 out Crescente pressão salarial preocupa os países ricos
Crescente pressão salarial preocupa os países ricos
Escassez aumenta poder de barganha dos trabalhadores.
Desde a greve dos coletores de lixo em Britghton, na costa sul da Inglaterra, até os milhares de funcionários que cruzaram os braços na fabricante americana de tratores John Deere, as lutas salariais estão se tornando um ponto crítico para os investidores e autoridades, num momento em que as economias se recuperam da pandemia.
Encorajados pela escassez de mão de obra, pela alta dos preços da energia elétrica e do custo de vida, os trabalhadores estão cada vez mais brigando com seus empregadores em torno de salários. Um dos maiores sindicatos da Alemanha pediu este mês um aumento salarial de 5,3% para vencer a inflação.
Algumas pessoas se preocupam com a possibilidade de as crescentes pressões salariais desencadearem uma espiral inflacionária semelhante à da década de 70, que levou à uma alta das taxas de juros e solapou as bolsas. Como alertou o Fundo Monetário Internacional (FMI) na semana passada, os bancos centrais têm de ficar “muito, mas muito vigilantes” com o aumento dos preços e de outros custos que contribuem para a alta dos salários e do núcleo da inflação.
Outros veem a tendência como um impulso, já passado da hora, aos salários em estagnação e como um reequilíbrio da renda em favor dos trabalhadores após anos de valorização dos ativos e dos altos retornos sobre o capital. O premiê do Japão, Fumio Kishida, que tentará se reeleger neste mês, chegou até a prometer benefícios fiscais a empresas que elevarem os salários dos funcionários.
“O capital humano ficou um pouco mais caro”, disse Carsten Brzeski, economista do ING. Segundo ele, com a aposentadoria da geração dos “baby-boomers” (nascida entre 1946 e 1964) e o repatriamento das cadeias de suprimentos pelas empresas, as pressões salariais que já ganhavam corpo antes da pandemia vão se fortalecer.
Mas até agora as evidências de aumento dos salários são, no melhor dos casos, desiguais. Mesmo em países em que as pressões estão crescendo, os salários podem não estar tendo qualquer aumento, se considerada a inflação – ou, pelo menos, não por enquanto.
As pressões mais claras são vistas nos EUA. Os gastos do consumidor estão sólidos, mas a força de trabalho está em cerca de 4 milhões de pessoas menor do que seu nível de 165 milhões de trabalhadores de antes da pandemia e a remuneração média por hora está subindo a uma taxa anual de 4,5%.
“As empresas vão precisar da força de trabalho para atender essa demanda e, se [os trabalhadores] não voltarem, teremos mais alta dos salários”, disse Alan Detmeister, economista da UBS.
Mesmo assim, a maioria dos aumentos se concentrada em setores de baixos salários. A decisão da Amazon de pagar aos funcionários de armazenagem um mínimo de US$ 18 por hora, por exemplo, fez com que outros grandes empregadores elevassem o salário inicial.
Além disso, o crescimento dos salários só superou a inflação ao consumidor, atualmente de mais de 5%, por dois meses. Nos últimos doze meses, os salários caíram, em termos reais. O crescimento salarial dos EUA, até agora, permanece “nas faixas normais”, estima o FMI.
No Reino Unido as pressões salariais também estão aumentando, com a escassez de caminhoneiros sendo apenas o exemplo mais visível da escassez de mão de obra, que atinge desde as cadeias de suprimentos de alimentos até equipes de filmagem.
O Banco da Inglaterra (BC britânico) crê que o crescimento médio da renda, de cerca de 4%, superou o nível pré-pandemia, enquanto pesquisas mostram um maior número de empregadores elevando os salários para atrair trabalhadores. Mas, como nos EUA, os aumentos parecem concentrados em setores de baixa remuneração.
Em outros países do mundo, as pressões salariais permanecem brandas, mesmo em setores em que os empregadores têm dificuldades em contratar.
Na Austrália, o número de postos de trabalho não preenchidos cresce a um ritmo mais rápido do que nos EUA, no Reino Unido ou no Canadá, segundo dados em tempo real do site de empregos Indeed. Mas o BC australiano disse recentemente que o crescimento dos salários continua “modesto”.
No Japão os salários também continuam a resistir à falta de mão de obra. Por 30 anos, eles permaneceram estagnados e, em agosto, houve uma expansão de 0,2%, em termos reais, em doze meses.
Quanto à zona do euro, há poucos sinais de aumentos salariais, embora o desemprego tenha caído para as baixas recordes pré-pandemia e o número de pessoas protegidas por programas governamentais de respaldo ao emprego tenha caído significativamente.
A IG Bau, o principal sindicato da construção civil da Alemanha, pleiteou neste mês um aumento salarial de 5,3% para 890 mil de seus trabalhadores. Mas, no fim, aceitou um aumento de 3,3% no ano que vem e de 2% em 2023.
Para Dirk Schumacher, do banco Natixis, esse “acordo moderado” sinaliza que o sindicato “não está preocupado com o risco de a inflação escapar ao controle ao longo da duração do pacto”.
Cinco dos principais institutos de economia do país concordam. Apesar de a inflação da Alemanha ter atingido sua maior alta dos últimos 29 anos, de 4,1%, em setembro, eles não veem risco de uma explosão de reivindicações salariais. Previram na semana passada que a expansão dos custos com mão de obra na Alemanha cairá de 3,4% no ano passado para 0,8% neste ano e para zero em 2023.
Os bancos centrais dos EUA e do Reino Unido indicam que vão se manter atentos. Já o Banco Central Europeu (BCE) parece mais relaxado. Philip Lane, seu economista-chefe, disse neste mês que “uma mudança não recorrente no nível dos salários não implica alteração de tendência da inflação subjacente”. (Com Martin Arnold, em Frankfurt, Colby Smith, em Washington, e Kana Inagaki, em Tóquio)
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