05 maio Índices de engajamento de funcionários caem em todo o mundo
Índices de engajamento de funcionários caem em todo o mundo
Especialistas acreditam que baixo comprometimento pode ser revertido com o desenvolvimento de líderes “inspiradores”.
As taxas de engajamento dos funcionários em todo o mundo caíram em 2024, com implicações para o desempenho das empresas. A baixa, de dois pontos percentuais – de 23% em 2023 para 21%, no ano passado – deve custar à economia mundial cerca de US$ 438 bilhões em perdas com produtividade.
Para se ter uma ideia, se o ambiente de trabalho em todos os países estivesse “totalmente comprometido” com os objetivos corporativos, US$ 9,6 trilhões em novos negócios poderiam ser adicionados à economia do planeta, o equivalente a 9% do PIB global.
As informações são do relatório “State of the global workplace/2025” (“Estado do ambiente de trabalho global/2025”, do inglês), que acaba de ser divulgado pela empresa de pesquisas Gallup. O levantamento ouviu 227,3 mil profissionais entre abril e dezembro de 2024, em mais de 160 países, inclusive o Brasil.
De acordo com o estudo, o problema apresenta nuances entre líderes e liderados. Enquanto o engajamento dos gestores teve uma queda mais visível, de 30% para 27%, o índice dos colaboradores, em média, permaneceu sem evolução, em 18%.
Para os analistas da Gallup, a maior insatisfação entre os gerentes é pressionada por novas prioridades das companhias e pelas expectativas dos times com o trabalho.
“Muitas organizações passaram por mudanças pós-pandemia, caracterizadas pela alta rotatividade de equipes e demissões”, destaca o documento. “Ao mesmo tempo, os empregados enfrentam a redução da flexibilidade nos expedientes. Tudo isso afeta os gestores globais, que ‘lutam’ para que tudo funcione bem.”
Liderança inspiradora
Na avaliação de Nelson Rosamilha, coordenador do MBA em Gerenciamento de Projetos e Agilidade Organizacional, da Trevisan Escola de Negócios, é possível inverter o cenário e escalar a conexão funcional em duas frentes: fortalecendo o relacionamento entre líderes e liderados, e com um ambiente de trabalho baseado em mais segurança psicológica.
“O gestor deve reservar tempo para diálogos individuais sobre progresso e objetivos”, diz o especialista ao Valor. “Nesses encontros, é importante oferecer feedback e coaching contínuos. São conversas que mostram ao profissional que ele é valorizado e tem apoio da chefia para evoluir.”
Segundo Rosamilha, pesquisas da Gallup apontam que cerca de 80% dos funcionários que recebem um feedback significativo semanalmente se mostram “altamente engajados”. “Ou seja, quando o líder demonstra interesse genuíno no desenvolvimento do empregado, o índice de engajamento tende a subir”, analisa.
A segunda sugestão do coordenador, de promover um ambiente de trabalho seguro, precisa contar com a ajuda de uma liderança considerada “inspiradora”.
“O que significa construir confiança com a equipe e dar voz a todos, para que os talentos se sintam seguros para compartilhar ideias e discordar, sem medo de punições”, ensina. “Um chefe inspirador serve de modelo e motiva o time a ir além dos interesses individuais, em prol do bem do grupo.”
De acordo com o pesquisador, estudos provam que o estilo de liderança “inspirador” está associado a uma maior motivação dos liderados. “Quando o funcionário confia no líder e se sente ouvido e encorajado, ‘veste a camisa’ da empresa com mais vontade.”
Rosamilha chama a atenção ainda para uma melhor preparação das chefias que lidam com o baixo comprometimento das equipes.
“No Brasil, muitos gestores estão presos a um modelo antigo de liderança, baseado apenas em cobrança de tarefas e resultados imediatos”, avalia. Outra análise feita pela Gallup indica que somente 44% dos líderes globais receberam um treinamento formal para gerenciar equipes, compara. “Sem preparo, o gestor acaba focando somente no operacional e deixa de lado o desenvolvimento humano, justamente o que mais engaja os times. Falta investimento na preparação das chefias.”
Autonomia nos expedientes
Guilherme Dias, CMO (diretor de marketing) e co-fundador da plataforma de gestão de capital humano Gupy, concorda com o coordenador da Trevisan.
Para aumentar o envolvimento funcional, deve-se investir no desenvolvimento de gestores que inspirem as equipes, argumenta. “Líderes bem preparados, que saibam estabelecer uma boa comunicação, são fundamentais para motivar os colaboradores”, diz. “A presença deles fortalece o comprometimento com a empresa e amplia a produtividade.”
Dias também defende uma melhor promoção da cultura organizacional. “Quando os times entendem e se identificam com os valores da empresa, se sentem mais motivados”, afirma. “A divulgação constante da cultura corporativa, por meio de treinamentos, eventos internos e campanhas de comunicação, reforça o sentimento de pertencimento e de alinhamento com os objetivos estratégicos, essencial para reduzir taxas de rotatividade.”
O diretor ainda destaca outro elemento com poder de integrar os funcionários, mas pouco explorado pelas empresas brasileiras. “É a autonomia, aliada a uma flexibilidade genuína – que vai além do home office e inclui horários adaptáveis – com liberdade na gestão de tarefas e maior controle sobre o ritmo de trabalho”, afirma.
O executivo acredita que esse modelo de produção é mais envolvente porque está ligado ao “empoderamento e à confiança”. “Funcionários com autonomia se sentem mais responsáveis pelos resultados e valorizados pela organização”, analisa. “Além disso, a autonomia está associada a maior produtividade e bem-estar, pois as pessoas conseguem trabalhar alinhadas com seus picos de energia e preferências pessoais, reduzindo o estresse e o risco de burnout.”
Liderança e empatia
Evelin Santos, diretora de recursos humanos da consultoria Robert Half, de seleção de executivos, destaca que programas de cuidado pessoal e de reconhecimento têm potencial de mobilizar o quadro funcional.
“Quando a empresa demonstra preocupação com o bem-estar dos colaboradores, fortalece a confiança e o vínculo emocional”, assegura. “Esse sentimento de cuidado aumenta a motivação e reduz os níveis de estresse.”
Reconhecer o esforço e a dedicação das equipes também é uma forma de reforçar os comportamentos positivos nas empresas, continua. “Além de recompensar grandes conquistas, é preciso valorizar atitudes diárias e a colaboração entre colegas”, ensina. “Funcionários que se sentem reconhecidos tendem a ser mais engajados.”
Santos afirma que quando a falta de interesse pelo trabalho contamina as lideranças, como mostra a pesquisa da Gallup, é hora de ampliar ações de segurança psicológica.
“O que mais desestimula os líderes é a combinação entre a alta pressão por resultados, a falta de espaço para a vulnerabilidade e culturas corporativas que reforçam a ideia de que demonstrar fragilidade é sinônimo de fraqueza”, analisa.
Embora os dirigentes encontrem motivação na realização profissional e no equilíbrio entre vida pessoal e trabalho, muitos não se sentem à vontade para pedir ajuda aos superiores, relata. “Mesmo em posições de liderança, existe o medo de se expor.”
A consultora diz que quando a liderança é vista em uma posição que exige um comportamento de “perfeição constante”, sem margem para dúvidas ou inseguranças, o resultado é o afastamento progressivo do que mais importa: a conexão humana e a construção coletiva de soluções com pares e subordinados. O discurso da resiliência extrema precisa dar lugar a ambientes em que o gestor possa ser apoiado, recomenda.
“Isso passa por incentivar conversas francas, treinamentos sobre liderança empática e a revisão das expectativas depositadas na gestão”, orienta. “O executivo engajado não é aquele que acerta sempre, mas o que tem espaço para se desenvolver, aprender com os erros e pedir ajuda quando necessário.”
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