Na alta gestão, mulheres seguem sub-representadas

Na alta gestão, mulheres seguem sub-representadas

Publicado em 11 de junho de 2025

Nas 310 empresas da amostra, de diferentes tamanhos e setores, elas estão em 17% das presidências e em 30% das diretorias.

O tema da equidade de gênero no mundo corporativo tem sido discutido há anos – e houve avanços importantes. No entanto, o ponto dessa balança mexe vagarosamente, e ainda estamos longe da igualdade nos cargos de alta liderança.

Em sua quinta edição, a pesquisa Panorama Mulheres, realizada pela faculdade Insper e o Instituto Talenses Group, e antecipada ao Valor, mostra que, em 2024, 17% dos cargos de presidência de empresas eram ocupados por mulheres – ante 8% em 2017. A presença de pessoas não brancas continua bastante baixa, somando 4 mulheres pardas nos cargos de presidência – frente a 35 brancas.

Na vice-presidência, a participação feminina passou de 18% em 2017, a 34% em 2022, e marcou 20% na edição mais recente. Na diretoria, as mulheres passaram de 21% dos cargos em 2017 para 30% em 2024.

Outro dado que acende um alerta é a quantidade de empresas que não contam com mulheres em cargos de alta gestão: 58,9% não possuem mulheres na vice-presidência, e 32,5% não têm diretoras.

“Há um ‘degrau quebrado’, barreiras visíveis e invisíveis que impedem a mulher de alcançar os cargos mais altos, de presidência e conselho”, afirma Carla Fava, diretora executiva do Instituto Talenses Group, uma iniciativa da consultoria de recrutamento Talenses Group dedicada a promover um mercado de trabalho mais inclusivo e equitativo.

De acordo com a pesquisa, mais da metade dos conselhos não tem mulher. “O quão preocupante é isso”, reflete Fava sobre esse aspecto.

Entre as 310 empresas respondentes, 61 possuem conselhos ativos, que somam 240 conselheiros. Desses, 41 são mulheres (17,1%), proporção semelhante à observada nas presidências. Mas, como pontua Fava, em 57,4% das empresas analisadas não há um assento sequer no “board” ocupado por mulher. Quando somadas às empresas em que a participação feminina é minoritária, o índice de baixa representatividade sobe para 83,6% – um retrato de como a governança corporativa ainda reflete padrões excludentes de gênero.

Ana Diniz, pesquisadora do Núcleo de Estudos de Gênero do Centro de Gestão e Políticas Públicas do Insper e responsável pela coordenação da Panorama Mulheres, afirma que dados reforçam que organizações com mulheres na alta gestão têm mais políticas estruturadas para equidade de gênero. “Não sabemos o que veio antes, mas é fato que [nessas organizações] há um ambiente mais promissor para a equidade de gênero”, constata.

A pesquisadora diz que os desafios surgem, de forma mais intensa, na hora de ascender a cargos mais altos, quando há menos cadeiras disponíveis. Ela reforça, no entanto, que as desigualdades fazem parte de uma cadeia. “Desde o processo de conduzir as mulheres a posições que são mais ligadas a cuidados e serviços, e os homens a entregas e produtos, que são áreas que levam mais rapidamente ao poder na cena executiva”, detalha.

Os dados da pesquisa mostram uma concentração significativa de mulheres em áreas que são tradicionalmente associadas ao feminino, como recursos humanos e comunicação. A área de pessoas se destaca como principal espaço de atuação tanto para vice-presidentes quanto para diretoras. Já o setor de marketing aparece com força entre as vice-presidentes, enquanto finanças, operações e jurídico ganham mais destaque entre diretoras.

A pesquisa também buscou investigar o tipo de empresa que as mulheres presidem – vale pontuar que as organizações presentes na amostra são de tamanhos variados, desde empresas com no máximo 45 funcionários (63 no total) até organizações com mais de 10 mil empregados (21), e de setores distintos, em uma tentativa de representar de forma fiel o ecossistema de empresas no Brasil.

Das 35 mulheres presidentes, 19 são empreendedoras ou empresárias, o que significa que fundaram o próprio negócio. Sobre isso, Fava comenta que os homens ascendem à presidência por meio da carreira executiva porque, historicamente, tiveram mais acesso a redes de poder, oportunidades de promoção dentro das organizações e assim por diante. “As estruturas corporativas foram, e em grande medida ainda são, desenhadas por homens e para homens”, afirma. “São cargos de decisão igualmente relevantes [presidir a própria empresa ou outra], mas na cena executiva os obstáculos são maiores”, complementa Diniz.

A análise mostrou, ainda, que as mulheres que chegam ao topo estão concentradas em organizações de menor porte. Enquanto 36% das mulheres estão à frente de empresas com até 200 empregados, 40% dos homens presidem grandes companhias com mais de mil funcionários.

Outro recorte diz respeito ao setor de atuação das empresas presididas por mulheres. A maioria delas lidera organizações no setor de serviços (55%), enquanto os homens estão mais distribuídos entre indústria, serviços, comércio e outros segmentos. Essa concentração pode indicar tanto maior acesso – dado o menor custo e a menor barreira de entrada no setor, assim como em empresas de menor porte – quanto limitações estruturais, comentam as organizadoras da pesquisa.

Para Fava, o avanço da pauta de gênero depende diretamente do envolvimento da alta liderança. Além disso, ela reconhece o papel central que a área de recursos humanos continua exercendo nas questões ligadas à carreira e ao desenvolvimento de pessoas, mas ressalta que esse protagonismo precisa ser compartilhado com as demais áreas. “Se o planejamento estiver só dentro do RH, ele não vai resolver o problema. E seguiremos, ano após ano, fazendo novas edições da Panorama e vendo o tema andar de lado.”

Diniz diz que, considerando que o problema não está resolvido, há indícios consistentes, validados por pesquisa, que quanto mais as empresas fazem as ações de forma estruturada, e não somente algo pontual, mais impacto conseguem para a igualdade de gênero. E faz um alerta. “Se tirarem o pé do acelerador, vão agravar o problema.”

Fonte: Valor Econômico
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